Quem já se deparou com figuras das casas ribeirinhas amazônicas, as famosas casas suspensas, deve se perguntar o porquê daquelas pessoas viverem tão à margem do rio nessas estruturas arquitetônicas de “palafitas”.

Em contextos que não seja o dos ribeirinhos, como em centros urbanos, essas construções são marginalizadas e até o próprio termo “palafita” é comumente atrelado à pobreza e usado de forma pejorativa. Em contraponto, em sua tese de mestrado, Fernando José Lima de Mesquita defende que essas construções “são passíveis de valoração enquanto patrimônio cultural brasileiro, pois representam um modo de ocupação reproduzido por séculos e que ainda sobrevive mesmo diante de inúmeras influências globais e homogeneizantes”. Confira a íntegra da tese aqui.

Construir sobre palafitas é a forma de existência e interação do povo ribeirinho com a natureza – as pessoas estão sobre as águas e convivem com elas. Toda esta dinâmica é o que dita o modo de vida: de morar, de comércio, alimentação, transporte… às margens dos rios, igarapés e lagos da Floresta Amazônica.

Uma citação de Weimer descreve muito bem por que este é o modelo arquitetônico adotado no Arquipélago do Marajó:

[…] no Marajó, como não há alternativa para as cheias cíclicas, que transformam toda a ilha anualmente num imenso lodaçal, as casas são elevadas acima do solo, e muitas vezes constroem-se passarelas entre as edificações, o que garante o deslocamento a seco entre elas durante todo o ano. […] Em toda a região amazônica, as estradas quase sempre são inexistentes, e são os cursos de água que se constituem nas vias de comunicação. Por isso as casas são construídas nas margens dos rios. Mas o nível desses rios varia muito em função das estações. Para esse problema existem duas soluções possíveis: uma é fazer a casa flutuar, outra é construí-la sobre palafitas, a uma altura tal que fique mais alta que o nível máximo das cheias. (WEIMER, 2005, p. 24 e 27)

UM POUCO DE HISTÓRIA

Os primeiros registros de moradias em construções elevadas do tipo palafitas datam do período neolítico, quando foram descobertas, no século 19, no lago de Zurique, Suíça, e em lagos e regiões de pântano da Itália, Alemanha e França (saiba mais aqui). A habitação sobre palafita geralmente era confeccionada em palha, madeira e ramos trançados e o piso era revestido com barro, possibilitando, desta forma, o uso do fogo no interior da casa.

As palafitas são comuns em todos os continentes, sendo mais presentes em áreas tropicais e equatoriais de alto índice pluviométrico.

ENCONTRANDO DESAFIOS

Embora este modelo de moradia seja considerado um patrimônio cultural, a realidade de quem vive nessas casas é, muitas vezes, desafiadora. As estruturas são precárias, as casas possuem pouquíssimo conforto e há muita limitação de acesso a recursos básicos como água encanada, coleta de lixo, rede de esgoto, energia elétrica e internet.

Existe um grande desafio de contribuir para a promoção de acesso a uma vida digna às mais de 350 comunidades ribeirinhas localizadas na Amazônia – que só foram reconhecidas oficialmente como população tradicional a partir de 2007.

Precisamos proteger e valorizar estes espaços! Uma vez que nossa Rede tem como objetivo contribuir com o desenvolvimento local por meio do protagonismo humano e territorial, entendemos que este trabalho passa por várias dimensões, incluindo a de “moradia, água e energia”.

Marajoaras e Rede Mondó, unidos pela crença de que a educação é um passaporte para o futuro!

Acreditando sempre que o desenvolvimento pode andar de mãos dadas com a preservação da natureza, a proteção dos bens culturais indígenas e com a promoção da dignidade humana, provendo o acesso à saúde, educação e renda.

Redação: Francine Leal Zanetti, Coordenadora do Núcleo de Moradia, Água e Energia
Edição: Maria Clara Oliveira, Gestora de conteúdo do Estúdio Memo
Revisão: Diógenes Santos, coordenador de Comunicação da ANUP